quinta-feira, 28 de julho de 2016

Sobre a película "Julieta", de Pedro Almodóvar




A ousadia do filme "Julieta", do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, começa pelo nome da película. Quem, senão Almodóvar, arriscaria escolher um nome tão clássico para ser resignificado no cinema? Imagine alguém ousar criar outra Julieta além da de Shakespeare? Pois Pedro o fez. E fez em grande estilo.
Um bom filme é aquele que nos faz pensar, aquele que a gente deixa a sala de exibição num certo estado de choque. Mas além de fazer pensar um bom filme tem que vir embalado num pano de veludo vermelho: imagens com direção de arte impecável e roteiro arrebatador.
É num veludo vermelho que "Julieta" abre as cortinas de seu roteiro. Aquela imagem fechada em um busto feminino vestido num belíssimo pano encarnado respira junto com cada expectador. Uma abertura perfeita que vai revelar Julieta ( Emma Suarez) em idade madura: uma mulher de cinquenta e poucos anos, bela, cheia de mistérios. Um personagem ambíguo, como cada um de nós. Julieta ensina filosofia clássica, fala bem diante de uma sala de aula, do contrário, cala-se. O silêncio costuma gerar pessoas dispépticas, diria Frederich Nietzsche. É possível amar um filho e conversar pouco com ele? Para Julieta sim, mesmo que isso gere uma filha infeliz e carente de equilíbrio. Precisamos falar mais, dialogar mais. Mesmo que esse diálogo doa como o corte de um bisturi, como afirma Freud. 
Julieta é um mergulho na alma humana, traz uma digressão após a outra. Reflete sobre culpa, vingança e o sentimento de alguém que teve um ente querido desaparecido. Sim, só é possível imaginar a dor de alguém que perdeu alguém assim, quem passou pelo mesmo problema. Seu filho desapareceu? Não é possível tanta dor! Melhor seria sepultar, pensa a mãe desesperada. A tortura de pensar em alguém que não se sabe para onde foi é devastadora.
No meio de tanta dor Almodóvar ainda encontra espaço para pensar o amor: o amor inconsequente de uma paixão relâmpago dentro de um trem, o amor que cresce ao ponto de se tornar uma tatuagem, um amor que ama e pune, um amor que não perdoa a luxúria.
A Julieta de Almodóvar não é apenas uma mulher bonita. É uma mulher inteligente, aventureira como um centauro sagitariano (Julieta jovem: Adriana Ugarte), confiante, intelectual, sexy, perigosamente silenciosa. 
Belos e complexos também são os outros personagens: a filha Antía, o marido Xoan. Com eles Pedro reflete sobre dor e fuga. Até onde será preciso fugir para tentar escapar da dor? Até a linha do horizonte de um mar em tempestade? Até as montanhas? 
Saí do cinema pensativa... E fiquei assim por mais um dia inteiro. Julieta já é um dos melhores de Pedro Almodóvar.

O cineasta espanhol Pedro Almodóvar nasceu em Madrid, no ano

de 1949. Ele estreou no cinema nos anos 80.

E de lá para cá lançou 21 filmes.

Almodóvar já foi indicado ao óscar 4 vezes por “Mulheres à beira 

de um ataque de nervos”, “Tudo sobre minha mãe” e “Fale com 

ela”.

Em Cannes já foi premiado quatro vezes:

em 1999 com “Tudo sobre minha mãe”, que ficou com o prêmio de

melhor diretor e melhor filme. Em 2006, melhor roteiro, com 

“Volver” e em 2011, ficou com o prêmio da juventude por “A pele 

que habito".





Ouça a trilha sonora de "Julieta" aqui:
https://www.youtube.com/watch?v=L2FnsopjVto