"Passo de novo na rua em que você nasceu só para respirar o seu ar", declara infantil Vercilo.
Só nunca havia dito isto a você. Pois é. Confesso que já perdi as contas de quantas vezes passei devagarinho pela sua rua "só para respirar o seu ar". Sua rua é aconchegante. Adoro o vento frio que corre debaixo daquelas castanholeiras. Parece que vão trazer você para e mim. E o fazem por um breve instante. Parece que sinto o seu cheiro.
Mas nem sempre encontramos as flores que procuramos. E sou levada a concordar com Benjamin que diz: "A construção da vida passa nesse momento muito mais pela força dos fatos do que pelas convicções. Concretamente de fatos que quase nunca ou em lugar algum chegaram a transformar-se em fundamento de convicções."
Amargo é o sabor da desesperança, que chega na inevitável forma dos fatos. Seu coração não é meu.
Se há esperança? Sim.
Torçamos para que as nossas convicções sejam todas tolas e furadas. E que as surpresas perfumem o ar.
E deixa eu ir dar um stop em Ne me quitte pas** que começou a tocar ali no meu som, antes que eu não amanheça! Sim. "Porque ontem eu morri, mas hoje não morro mais" (PINHO).
Letícia Amaral
*no Livro "Imagens de pensamento", cap.Estação de Serviço, Walter Benjamin (Assírio & Alvim, tradução João Barrento)
**com Jacques Brel
***foto: Boneco de Neve, jan.2013 Londres, foto e escultura by Letícia Amaral)